Acordei mais cedo do que de costume, mas não pestanejei pra sair da cama quando o alarme anunciou o nascer do dia. Amarrei o cabelo, lavei o rosto, sequei as mãos e fechei os olhos. Respirei fundo duas ou três vezes até ter coragem de encarar o meu reflexo. Abri, devagarinho, os olhos. E me vi ali, assim, com a alma despida e o peito cheio de vontade de transbordar tudo o que eu mantinha escondido em mim. Sorri, feliz, mudada. Contei até dez e tomei coragem para fazer o que eu precisava fazer. Para se desprender do passado você não pode deixar ponta de nó disponível pra volta, eu precisava me desenlaçar.
Dizem que não olhar pra trás faz os sentimentos começarem a desaparecer, pode até ser que isso seja verdade, mas ignorar o passado também te faz ignorar todo aprendizado, todas as vezes que você caiu e levantou, vezes que, para mim, foram muitas e que me ensinaram a ser mais forte. A cada tombo eu aprendia a ficar menos tempo no chão. A cada levantar eu adquiria mais equilíbrio. E eu não quero esquecer disso. Não quero esquecer que foi difícil e que eu chorei por quase um mês inteiro, mas que acordei em um dia qualquer com o sol me convidando para ir viver e eu fui. Não quero esquecer que o ano começou com uma promessa e que acaba com uma certeza, e que isso é graças ao passado.
Olhar pra trás é, antes de mais nada, um ato impensado, mas refletir sobre ele não. Refletir sobre o passado requer coragem. Para encarar seus monstros é necessária uma alta dose de valentia. Hoje, quando olho a minha primeira fotografia de janeiro enxergo uma menina perdida dentro de si mesma, gritando em silêncio o desespero de um coração partido. Vejo alguém que precisava de ajuda para achar o caminho de volta pra casa. Ela estava sozinha e assustada. A pior coisa que pode te acontecer não é chegar ao fundo do poço, é não saber como sair de lá. Quando os primeiros fogos eclodiram no céu anunciando a entrada de 2014 eu prometi que daria um jeito naquilo tudo. E eu dei.
Aquela menina cresceu, dia após dia, e dentro dela uma mulher foi florescendo. Eu bati muito com a cabeça na parede até entender que não adianta fingir pro mundo que a vida anda boa se a tua primeira reação ao encostar a cabeça no travesseiro é chorar tuas mágoas e dores e anseios. Choro em silêncio dói mais. Admitir que alguma coisa não anda bem é admitir que é preciso melhorar. A gente aprende que desfilar na balada com sorriso no rosto e o coração no chão é mais penoso que cair em prantos no meio da rua. A sua cara te denuncia mesmo quando teu olho preto está encharcado de rímel. Entende? A gente precisa encarar nossas dores sem se preocupar com o que vão pensar. Eu dei o primeiro passo quando rasguei a armadura fria que protegia o mundo das minhas cicatrizes e enfrentei cada arranhão que minha pele guardava. Passou janeiro, fevereiro, março, abril. E eu aprendi a sorrir quando queria, e chorar também, e gritar, e fechar a cara, e rir. E hoje eu riu muito, sabe? O tempo todo, porque quando a gente se aceita como é, a vida fica mais leves, o ciúmes mais bobo, as dores menores, e a raiva mais calma. Além do mais, já dizia a minha vó, rir é o melhor remédio. E eu sei que é.
Passou mais um tempo. Os dias correram, se foram os choros no meio da noite e a vontade de fugir do mundo. Eu aprendi a me aceitar como sou. Eu aprendi que meus defeitos são tão importantes quanto as minhas qualidades, aprendi, também, a me amar com cara de sono, sem maquiagem, e de pijama rasgado. Aprendi a andar de cara limpa porque nessa ação tinha muito mais do que mostrar as imperfeições do rosto. Eu tava aceitando minha alma. Eu tava aceitando as minhas marcas, e meus dramas, e minhas derrotas. Esse foi o meu primeiro grande salto. Agora eu já andava e saltava e estava mais perto da luz. Para chegar em terra firme eu só precisava encarar meu último pesadelo.
A batalha mais difícil é aquela que decide a luta, é a atração principal que fica pro final do show. A ferida estava ali, mexer nela pedia força, coisa que eu adquiri conforme o calendário avançou, respirei fundo, contei até dez, e enfiei o dedo onde mais doía. Chega uma hora na vida em que a tua única opção é erguer a cabeça e abrir mão do que já não serve mais. Eu precisei abrir mão de uma história inacabada para sobreviver. Eu precisei decidir entre tirar do futuro o que me prendia ao passado ou viver fadada ao olhar de compaixão de quem sabia, tanto quanto eu, que algumas coisas terminam na metade e que não adianta esperar por quem já foi embora uma vez. O final dói. Mas a dor te ensina. E eu agraço por ter doído. E por ter superado. E por estar feliz. E por poder sorrir. E por me olhar no espelho e gostar do meu reflexo, principalmente daquele que só eu vejo.
Fazem doze meses que eu prometi sair de onde eu estava, a jornada foi longa, exaustiva e eu quase desisti, quase me rendi ao medo e despenquei profundo, novamente, mas tive força, e nos momentos mais difíceis eu pude contar com a única pessoa que nunca desiste da gente. Eu fui persistente, me agarrei onde tinha espaço, e aguentei firme. E sobrevivi. E venci. E mudei. E cresci.
Ontem eu era uma menina assustada, hoje eu não sei bem o que eu sou, mas tenho certeza do que quero ser. E eu quero ser alguém que até pode cair, quebrar a cara, bater com a cabeça na parede e errar um milhão de vezes, mas que vai saber a hora de parar, respirar fundo, sacudir a poeira e seguir em frente.
A vida é um grande teste, ganha quem passa por ela acertando mais, e eu tenho acertado, muito.
Que venha o próximo round.
Esse texto foi escrito pela Gabriela Freitas. Repostei pois reflete o que eu sinto no momento.
10 comentários
Ótimo texto, acho que é exatamente dessa forma que muitas de nós nos sentimos.
ResponderExcluirSaga de beleza
Verdade, bom que gostou! Xoxo' ♥
ExcluirNossa, que blog lindo e que texto maravilhoso! A autora está de parabéns, uau, vou acessar ao blog dela!
ResponderExcluirBeijão, www.opinada.com ♥
Own sua linda, bom que gostou. Muito obrigado. Acessa sim, o blog dela é maravilhoso! Xoxo' ♥
ExcluirQue texto inspirador. Parabéns! ♥
ResponderExcluirA parte boa das decepções é que a gente cresce muito e aprende também. E a cada decepção, a gente aprende a se erguer mais rápido. Que você continue assim, está no caminho certo. ;-)
Beijocas,
Carol
www.pequenajornalista.com.br
Eu adorei esse texto Lilly, não tenho nem palavras para expressar.
ResponderExcluirA Gabriela escreve muito bem, ainda não conhecia essa blogueira.
Depois de um texto desses que quase me fez chorar com certeza vou procurar conhecer mais sobre ela.
http://garotapassageira.blogspot.com.br/
Agente s vezes nem percebe as horas passar é quando vai ver perdemos muitas coisas, adorei o texto, super beijo.
ResponderExcluirwww.marivieira.com
http://youtu.be/WGG-wtblbMo
Esse texto diz muito o que eu senti e ainda sinto algumas vezes quando algumas pessoas do passado insistem em bater na minha porta.
ResponderExcluirÉ incrível como as palavras podem dizer o que sentimos.
bjx
http://vinteanoos.blogspot.com.br
xx
Lilly esse texto é magnifico eu já o conhecia do NP, é ótimo para refletir!
ResponderExcluirBeijos <3
http://fabilimablog.blogspot.com.br/
É chega uma hora na vida que temos que ver o melhor pra nos né, a gente tem que crescer.
ResponderExcluirhttp://teoremademari.blogspot.com.br/
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